sábado, 23 de junho de 2018

Sobre usar a internet para se relacionar

Missionários da Jocum Monte das Águias,
em Almirante Tamandaré pouco antes do tempo de oração
sobre o uso da internet
e das relações nas redes sociais da web
Por Larissa Mazaloti - Jornalista e Missionária
FONTES DE PESQUISA: SITES CONTIOUTRATECHTUDO (G1) E RESULTADOSDIGITAIS
Imagine que uma pessoa está envolvida em uma situação difícil e depende de outra pessoa que pode ajudá-la. Mas está tão fragilizada, desmotivada e fraca diante dos problemas que está enfrentando e até mesmo sem conseguir enxergar possibilidades, que não consegue falar tudo o que precisa para a outra pessoa que tem condições de fazer algo por ela. Então uma terceira pessoa entra nessa história e vendo a necessidade da que está precisando e resolve falar com a pessoa que tem a solução para o problema, mesmo que não tenha nada a ver com a questão entre as duas pessoas que comentei no início.

Isso é interceder por algo ou alguém.

Entre cristãos, no caso da oração, chamamos isso de intercessão e ela acontece quando uma terceira pessoa ora a Deus a respeito de outra que está precisando, ou sobre uma causa, lugar, povo.

Aqui na Jocum Monte das Águias, missão onde sou voluntária, temos um período de intercessão em grupo duas vezes na semana: nas quartas e sextas-feiras. Isso significa que paramos para ouvir Deus sobre o que Ele quer que seja orado.

Em um desses dois dias temos a intercessão criativa que acontece através de uma proposta de tema específico para ser orado. Na última semana eu tive a oportunidade conduzir esse momento e o tema que entendi de expor foi o uso das mídias sociais: a internet como meio de relacionamento e parte da vida real das pessoas.

Por isso nos reunimos e nos separamos em vários grupos e eu enviei os motivos de oração que pesquisei e elaborei por mensagem no whatsapp, dando o exemplo real de como é possível comunicar com relevância no mundo virtual.

Quero compartilhar com você os motivos, para que você também reflita um pouco sobre o assunto!

 MOTIVO 1
A internet é utilizada diariamente por 3,2 bilhões de pessoas no mundo. Assuntos de todos os tipos são tratados quase que sem controle algum. Essa liberdade de expressar-se pode levar interações virtuais para extremos perigosos. Política, religião, ideologia de gênero, esporte podem despertar o melhor e o pior da humanidade atrás de uma tela.

MOTIVO 2
O brasileiro gasta, diariamente, 9 horas e 14 minutos navegando na Internet, através de qualquer dispositivo. Somos o terceiro povo no mundo que mais passa tempo na rede. Em primeiro lugar, estão os tailandeses, com 9h38m, seguidos pelos filipinos, com uma média de 9h29m. Será que esse tempo é bem aproveitado por nós? Quanto de tempo temos dado para nossas famílias perto do tempo que gastamos na internet?

MOTIVO 3
É difícil imaginar a dimensão que fotos, vídeos e palavras podem alcançar, quando circuladas em redes sociais, tal como aquela famosa corrente que vai sendo passada de um para o outro e, de repente, já “viralizou”, alcançando milhares de pessoas.

MOTIVO 4
A grande maioria dos suicídios relacionados à internet é de adolescentes mulheres que foram vítimas de pessoas com que se relacionavam. Adolescentes e adultos jovens têm poucos recursos mentais para lidar com a pressão e o bullying que a internet pode trazer, pois a adolescência é uma fase em que precisamos ser aceitos e reconhecidos pelo grupo a que pertencemos.

MOTIVO 5
62% da nossa população está conectada através das redes sociais
Isso mesmo: 130 milhões de brasileiros utilizam as redes sociais. Desses, 120 milhões realizam o acesso através de seus celulares. Esse número representa 57% do total da população brasileira.

Diante desses  números, vamos pensar sobre o uso da internet por cristãos: como se comportam e o que comunicam os que se dizem seguir a bíblia como orientação de suas vidas? Como você influencia seus contatos nas redes sociais? O que você curte e compartilha diz muito sobre você.

MOTIVO 6
Conclusão: A internet e todo o ambiente que ela proporciona são parte importante da vida neste tempo de globalização e conexão. No entanto, é preciso repensar nosso ponto de vista e a nossa atitude nesta gigantesca rede de contatos.





quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Profetadas e misticismos à parte...

Profecia, essa palavra que vive na boca de muitas pessoas que se consideram “espirituais” é muito mais simples do que se faz parecer. Não é algo místico ou esotérico, não tem a ver com nenhum tipo de magia. De forma muito simples a palavra tem como uma das definições, a predição ou previsão de algo cuja inspiração diz-se ser divina. Budistas citarão Buda, Hindis citarão Shiva, Muçulmanos citarão Maomé, Cristãos citarão o Espírito Santo, terceira pessoa da trindade (Deus Pai, Filho (Jesus) e Espírito Santo). Vale tudo? Talvez para muitas pessoas sim, mas para os que seguem Jesus Cristo é unânime: que toda e qualquer profecia/previsão/vidência de todas as pessoas citadas na bíblia até chegar a Jesus vem do Espírito Santo.
Mas e agora que Jesus morreu, ressuscitou e diz a bíblia “subiu aos céus e está sentado à direita de Deus o Pai”? Não há mais profecias? Sim! Há! Há porque uma vez que o cristão acredita que Jesus é Deus que se fez homem, o santo espírito de Deus passa a habitar dentro de cada um de nós e portanto pode nos inspirar a profetizar.
Em toda a bíblia a profecia acontecia mediante uma mensagem transmitida de Deus aos homens, os profetas eram a voz de Deus sobre acontecimentos presentes e suas consequências, bem como sobre coisas do passado que cada geração deveria saber. Se Deus falava com esses profetas pode-se afirmar que há um relacionamento entre o ser humano e Deus. E não é que é assim ainda hoje conosco?
“Sem intimidade com Deus a profecia é um estrago para a igreja”. Considero essa frase autoexplicativa. Ela não é minha, mas foi dita por Arthur Martins, pastor da Igreja Presbiteriana República, de Curitiba, na primeira terça-feira de novembro deste ano. Durante esse mês República está realizando a Escola de Profetas, uma espécie de curso ou, pode-se chamar uma série de encontros que em minha opinião desmistificam muito desse dom que está descrito na bíblia como “dom de profecia”.
Na primeira carta do apóstolo Paulo para a igreja de Corinto, ele orienta de forma clara e objetiva a função da profecia. Ela deve fortalecer, animar e confortar um grupo de pessoas ou mesmo uma pessoa específica. Arthur também afirma que a profecia, para quem a recebe, é uma palavra objetiva de Deus para a pessoa. Então entendo que se  a mensagem não cumpre o objetivo de fortalecer, animar e confortar é preciso tomar cuidado com o conteúdo dela. Se a transmissão machuca e desencoraja as pessoas, se o que é falado não produz a consciência da realidade, então há que se rever.
Quero citar alguns pontos bem interessantes que são fruto do estudo do pastor Arthur a respeito da excelência do coração do profeta ou seja, do transmissor de uma mensagem que cremos vir de um  Deus que criou tudo, que se comunica, que conhece a natureza humana e que ama essa criação.

AMOR: O dom de profecia é um instrumento de amor
PERDÃO: Um coração amargurado emite uma mensagem amarga
CONHECIMENTO TEOLÓGICO: Toda profecia deve ser bíblica. A bíblia é a palavra de Deus e qualquer coisa que destoe do que Ele já disse não é confiável
FÉ: O profeta deve crer no que profetiza
INTIMIDADE COM O ESPÍRITO SANTO DE DEUS: Saber se o que Deus comunicou é para ser dito, para quem deve ser dito, quando e como deve ser dito
HUMILDADE: O profeta deve lembrar que não é o único porta-voz de Deus e que dom não depende de bons frutos. Dom é dado de graça, sem merecimento. Não é porque Deus falou algo através de uma pessoa que ela é cheia de virtudes

A arte é profética ou a profecia é uma arte?
Profecia não é um pensamento positivo ou uma mensagem motivacional de auto-ajuda. Profecia é exclusivamente algo que Deus quer expressar, e são muitas as formas de Ele manifestar sua vontade e seu pensamento para a humanidade.  De acordo com as habilidades que Ele mesmo deu para cada pessoa Ele utiliza maneiras diferentes de falar. A arte é um dos pontos cruciais de manif
estação da voz de Deus, porque há uma sensibilidade do artista que conecta à mensagem alguém que não tem relação nenhuma com Deus e a partir de uma experiência com a arte do profeta passa a conhecer a pessoa de Jesus, o caráter de Deus.
A profecia não tem nada a ver com mensagens espíritas ou místicas, mas trata-se sim de um relacionamento pessoal e íntimo entre criatura e criador, entre filho e pai. Ela depende da total transparência e verdade e está ligada a uma vida de consciência diária dos impulsos da natureza humana que caiu, mas que foi redimida e agora vive agradecida por uma segunda chance. A vida de um cristão deve ser uma mensagem, uma profecia.
Por que escrevi sobre isso?

Porque sei que um dos grandes calos no sapato de quem tem lá suas resistências à “religião”, aos cristãos, à Deus é exatamente os estragos já causados na e pela igreja. Não é uma crítica à igreja, porque sou parte de/com ela. Mas o fato é que há no meio das vozes que se erguem para profetizar, como há no meio de qualquer grupo de seres humanos, pessoas ignorantes ou as de má intenção, ou mesmo as desavisadas, talvez cegas. Mas que nada disso desabona quem Deus é e o que Ele pode fazer independente da falha humana e o quando é bom conhecê-lo passo a passo.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Informativo: Viagem ao Paraguai

Na última semana fiz uma rápida viagem para Capiatá, no Paraguai, cidade bem próxima da capital Asunción. Foi algo de última hora, para o que fui desafiada a acompanhar a líder da ETED (Escola de Treinamento e Discipulado) na qual trabalhei neste semestre, para uma visita pastoral à equipe de alunos e obreiros que está naquele lugar cumprindo seu tempo prático da escola, que no total é de dois meses.
Minha função foi a de apoiar minha líder para transmitir ânimo, encorajamento e gratidão a esta equipe de 10 alunos e 3 obreiros que voluntariamente estão passando seus dias servindo a nação paraguaia. Estão enfrentando o calor intenso, as diferenças de idioma, moeda, costumes e acomodados em alojamentos e trabalhando com a igreja, escolas, construção e dentro de alguns dias irão para uma aventura por quatro dias dentro de um ônibus alugado para percorrer o interior do Paraguai.
Pudemos ter um tempo precioso com cada aluno, ouvindo seu relato sobre o tempo vivido até aqui, sobre as dificuldades e as conquistas e através de uma incrível e poderosa mediação do Espírito Santo falar a eles palavras de amor e incentivo.
Vimos uma igreja aberta a um novo tempo, feliz com a presença de brasileiros que estão ouvindo a Deus e que estão abençoando seus membros e liderança. Mas o que mais eu, particularmente vi foi uma nação humilde, serva, apaixonada por Jesus amando muito esses brasileiros.
E nesta conta eu entrei por menos de uma semana, para me somar aos que estão experimentando de uma dos amores mais puros que já vivi. Patrícia e eu ficamos hospedadas na casa da família do casal Miguel e Celeste e dos filhos Romina e Angel, e claro, da pittbull mais amistosa que já vi, a Tita. Fomos recebidas com todo zelo, com toda comida, com toda atenção. Me senti amada de forma gratuita, porque eu, diferente da equipe não estava lá servindo a nação ou a igreja, fui para servir a própria equipe. Tive conversas com a Hermana Celeste em que pude conhecer a história dela e poder conhecer mais de Deus através disso.




Nesta viagem o João não foi, pois tinha marcado um passeio com a escola dele no parque Beto Carreiro, em Santa Catarina. Enquanto eu estava lá ele ficou com a Helô, uma grande amiga que também é missionária aqui na Jocum onde vivo.



Quero deixar aqui meu agradecimento público aos meus pais que ofertaram o passeio do João e às minhas amigas, Dândara e Senhorinha que prontamente se dispuseram a financiar minha viagem ao Paraguai. Além disso, aos meus parceiros (que não tenho como nominar) de oração e financeiros mensais, aos eventuais e aos que já contribuíram para a construção da minha casa. Vocês são os canais que Deus escolheu usar para que minha vida e do João Felipe seja possível em missões!

domingo, 5 de novembro de 2017

Risco

Para ouvir enquanto lê: VOZ


Foi por volta de sexta-feira da semana passada quando, repentinamente uma frase surgiu em minha mente: “Lança o teu pão sobre as águas”. Como estou a quase quatro anos lendo a bíblia diariamente e ouvindo mensagens sobre o evangelho, pelo menos semanalmente, rapidinho eu sabia que se tratava de um trecho bíblico. Como não podia parar para pensar sobre isso naquele instante, somente anotei no meu caderno para lembrar na próxima vez que fosse meditar.
Quando eu digo que a frase surgiu, quero dizer que foi como o ressoar de uma orientação, um encorajamento, foi um voto de confiança de alguém que poderia me assegurar que algo daria certo. Essa sensação foi confirmada quando encontrei o trecho na bíblia, no livro que se chama Eclesiastes, no capítulo 11, no primeiro verso. Isso porque a sequência do texto dizia: “que depois de muitos dias o achará”.
Vamos então à frase inteira: “Lança o teu pão sobre as águas, que depois de muitos dias o achará”. Se o pão hoje é algo essencial em nossas mesas, na época do Antigo Testamento e depois, na época de Jesus, o pão era muitas vezes tudo o que eles tinham. Não por acaso a oração mais conhecida e aceita em diferentes religiões diz: “dai-nos o pão nosso de cada dia”. Sendo assim, penso que dizer a alguém daquela época: “lança o teu pão sobre as águas” é no mínimo muito corajoso da parte de quem pede. Como assim, o meu pão???
Mais entendidos de teologia talvez tenham a expressão exata do que o autor de Eclesiastes quis dizer. Mas, dentro de mim, o que ficou muito claro é o fator de risco que devemos assumir em nossas vidas. Posso trazer o “meu pão” para o que eu tenho de mais valor, o que é mais essencial para mim. E pra ser mais específica e profunda no que minha compreensão chegou, é que não tem nada a ver com valores materiais. Mas tem a ver com algo de precioso no meu ser, do qual preciso lançar mão, ou seja, abrir mão.
Arriscar é naturalmente fazer algo sem garantia de acerto. Por isso é que resistimos tanto em caminhar por estradas desconhecidas, ou mesmo nos imaginar sem alguma coisa da qual imaginamos que precisamos muito. Mas a bíblia, a qual acredito conter integralmente aquilo que Deus pensa, diz que eu posso abrir mão de qualquer coisa sem medo, porque haverá um retorno positivo.
Há uma versão da bíblia de Eugene H. Petterson que diz sobre esse texto que o “pão sobre as águas” é não economizar em misericórdia, e ainda garante que a misericórdia é um investimento que trará bons rendimentos. Não se trata de uma troca que fazemos, se trata de uma promessa que recebemos, a certeza de que podemos confiar no cuidado de Deus, o qual na coletividade acredito ser soberano sobre toda a criação e na individualidade Pai de cada pessoa.
O resumo do livro Eclesiastes é de que a vida é muito curta e de que todas as coisas são apenas vaidade. Por isso essa orientação para que possamos abrir mão de coisas, que mesmo muito tempo depois entenderemos que não nos arrependeremos de termos lançado. Que vivamos o risco de amar, o risco de se entregar, o risco de abandonar a justiça própria, o risco de assumir que somos amados, mesmo que sejamos muito imperfeitos, o risco de crer no invisível: o risco da fé.

Ah, para os desavisados, a frase que surgiu em minha mente é o que os cristãos mais doidos dizem ser “ouvir a voz de Deus”, ou... “Deus falou comigo”. 

Referências: Eclesiastes 11:1 (Almeida Revista e Atualizada e A Mensagem)

quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Intrínseco


Estar em Jesus não é uma condição, é um destino. Estar “em”, e não “com” Ele faz dessa relação algo muito mais profundo do que um “estado de espírito”, mas é uma vida “no” espírito. É intrínseco, é como uma mistura homogênea, na verdade é mais ser do que estar.

A co-relação traçada pelo próprio Jesus a respeito da videira e seus ramos aponta para um desejo Dele mesmo de uma relação onde as convenções não determinam os valores, mas essa vivência entre Ele e eu, eu nEle e Ele em mim, feitos da mesma substância, compostos da mesma essência.

Jesus é o potencial para as virtudes que ainda não tenho. Viver Nele é a evidência de que eu passei de um lugar a outro, que saí de uma condição para outra. É o abandono da condição burra de estar preso em si mesmo (imperfeição) para ligar-se nEle (perfeição). A obediência ao EU é escravidão, a obediência a Ele é liberdade.

sábado, 2 de setembro de 2017

Transformar a realidade do povo Sanumá mudou a vida de missionário

Mimica em momento de descontração com a comunidade Sanumá (Reprodução do Facebook)


Desde 1991 vivendo no leste de Roraima, Mimica é nacionalmente conhecido pelo intenso e positivo relacionamento com a cultura indígena

Por Larissa Mazaloti

Ademir Santos Silva, 53 anos, natural de Itacaré, Bahia tem no seu currículo, além de boas histórias, pelo menos vinte malárias contraídas desde 1991 quando foi morar no meio dos Sanumá, uma etnia indígena do leste de Roraima. O povo Sanumá cuja língua é um subdialeto dos Yanomami tornou-se a família de Mimica, apelido pelo qual Ademir é conhecido em todo o Brasil. Mimica conheceu a esposa - mãe de seus dois filhos – Lucelene, em uma de suas idas para cidade para tratar a malária, que segundo ele, era um dos poucos motivos que o tiravam da tribo naquela época.
Reaproveitando material dos 'brancos',
um dos indígenas adpatou
os cipós para confeccionar
seu par de sandálias. (Arquivo Pessoal)

Mimica participou de duas escolas de treinamento em 1990, sendo uma delas voltada para estudos e vivência na área de Linguística. Ele conta que ao final do tempo teórico, quando uma equipe se preparava para ir até a tribo indígena, por conta de sua falta de habilidade com os métodos práticos ele ficou encarregado de fazer o que se chama de promoção social, ou seja, cuidar de tudo para que os linguistas fizessem o trabalho de campo. Mas com a convivência entre os Sanumás, em três meses de relacionamento na comunidade, Mimica já conseguia se comunicar o suficiente. “Um dia falando em uma reunião entre eles, perguntei se eles entendiam o que eu estava falando, um deles se levantou e disse: ‘evidente que estamos entendendo, pois você está falando em nossa própria língua’, e me faz lembrar a passagem bíblica de Marcos16:17 que diz: ‘Falarão novas línguas’”, relembra.  Com menos de seis meses Mimica traduzia para as equipes de saúde da Funasa e pregava nos cultos. Isso aconteceu e mudou a história dele e daquela tribo porque ele garante que Deus deu a capacidade de falar a língua daquela nação (cada etnia indígena no Brasil é considerada uma nação). “Tudo isso aconteceu porque meu coração estava disposto a servir”, afirma.
Indígenas Sanumás. (Arquivo Pessoal)

A realidade do missionário Mimica é bastante diferente de tudo o que se considera como objetivo de vida na sociedade. Segundo ele, no início acostumou tanto com a cultura dos indígenas que quando precisava sair da tribo mal conseguia falar o português, mas que hoje entende que é momento de compartilhar mais sobre as experiências que tem. Por isso ao passar pelo Paraná visitou algumas bases da organização Jocum (JovensCom Uma Missão) e contou sobre seu estilo de vida. Além da Jocum, a família Silva também está ligada a Meva (Missão Evangélica da Amazônia).
Momento de culto de Santa Ceia dos Sanumás.
No lugar do pão, o beiju. (Arquivo Pessoal)

Decisões que mudam tudo  

“Diante das decisões tomadas em um determinado momento é preciso ter consciência das responsabilidades que elas trazem”. Isso é o que Mimica defende ao relatar que em 1990 quando estava na tribo indígena com uma equipe, os demais decidiram ir embora e ele optou por ficar. “Quando você toma uma atitude, e se responsabiliza, alguma coisa tem que acontecer, lá na frente terá que continuar decidindo para dar continuidade”, diz.

Indigenas com seus certificados
de conclusão do curso de liderança.
(Arquivo Pessoal)
Citando um versículo bíblico que diz que se um grão de trigo cair na terra e não morrer não vai dar fruto ele compara como tem que ser a vida de quem quer andar na contramão do que todo mundo costuma pensar e fazer. “Se não morrer para os próprios desejos interiores, não vai frutificar. Quando decidi abrir mão do tipo de pensamento da minha cultura, e aprender viver a cultura daquele povo, aflorou tudo o que Deus queria realizar na minha vida e na deles”, comenta.

Mimica é consciente que estar disposto a transformar a vida de outras pessoas que precisam, automaticamente muda a própria vida dele. “Quando pensamos só em nós mesmos, ao fazer algo pelo outro pensamos que estamos perdendo, que nosso retorno é ficar triste, mas servir faz com que eu receba muito mais do que imaginava”, conclui.

Parece cena de filme, mas não é

Entre muitas histórias que viveu, Mimica conta de uma em que alguns policiais estiveram na área indígena na qual ele morava e servia. Ele lembra que são duas horas para chegar com um avião bem pequeno nessa região de Roraima, e que nem ele nem os indígenas perceberam que pousou um avião com esses homens. Os indígenas chamaram Mimica para falar aos militares do Exército que havia quatro homens diferentes rondando a comunidade, pois os indígenas não falam português, então os policiais “entenderam” que Mimica estava tentando atrapalhar a missão que eles estavam realizando, e isso foi o motivo principal de sua prisão, apesar do bom relacionamento com todos do quartel, e mesmo assim eles resolveram cercar a casa da família de Mimica, armados e entraram na casa, pelos quais fizeram várias acusações e o levaram preso.

“Quando se pintam de vermelho os indígenas estão em paz, mas quando se pintam de preto estão prontos para a guerra com seus arcos e flechas, e foi assim que eles planejaram cercar o quartel onde fui preso, mas antes que isso acontecesse, mas muitas pessoas estavam orando e o resgate que os Sanumás estavam planejando graças a Deus não foi necessário”, detalha. Mimica diz que depois dos fatos acontecidos, em uma conversa com um dos líderes daquela tribo, disse que os policiais poderiam ter atirado neles. “A resposta dele para mim me mostrou que eles estavam muito mais dispostos a morrer por mim do que eu por eles, e eu entendi o quanto valia a pena ajudá-los a cuidar da saúde do povo, viver na cultura deles, ensiná-los coisas novas e bons princípios para suas vidas”, conclui. O processo contra Mimica foi arquivado, e após cinco anos recuperou seus R$ 300 pagos na fiança.
Sanumás diante de uma bíblia em sua própria língua e do Proclaimer,
um aparelho que reproduz em áudio
o Novo Testamento no idioma
que é um subdialeto dos Yanomami. (Arquivo Pessoal)
Reconhecimento


Duas das mais influentes missionárias da Jocum confirmam o respaldo de Mimica por sua vida de dedicação e trabalho em meio ao desconhecido. A linguista Márcia Suzuki, que hoje vive com a família entre os Navajos - uma tribo indígena norte-americana – foi professora dele em uma escola de treinamento transcultural em Porto Velho. “Super inteligente e engraçado, mas com poucos anos de escolaridade, sofreu um bocado para aprender linguística. No final do curso tivemos uma semana de projeto de aprendizagem de línguas e foi aí que ele se revelou. Em poucos dias estava falando a língua Nadeb melhor do que todos os colegas. Mímica tem um dom natural para comunicação, um coração enorme, e é radicalmente obediente ao Senhor”, afirma Márcia.
 Edna Gaspar também está fora do Brasil com sua família há alguns anos, morando em Nova Zelândia ela trabalha com os nativos Maori e também demonstra reconhecimento. “Amigo querido, saudades desse herói”, escreveu ela em uma rede social ao ver uma foto de Mimica.


domingo, 27 de agosto de 2017

Vida comunitária: um desafio diário vivido por missionários

Apesar das diferenças, parece que a maioria tem mais pontos positivos do que negativos para contar

Por Larissa Mazaloti, Viviane Nery, Caleb Walace / GNI Brasil


 Em muitas culturas ao redor do mundo, a vida em comunidade é parte principal da característica da população. Mas especialmente no ocidente, essa não é a opção mais desejada pelas pessoas. No sul do Brasil por exemplo, o individualismo e a independência são elementos do cotidiano, principalmente dos grandes centros e de suas regiões metropolitanas.
Treinamentos atraem jovens para
a vida em comunidade
 (Foto: CM Jocum/Facebook)

 Em Almirante Tamandaré, cidade localizada há pelo menos 20 minutos do centro de Curitiba, capital do Paraná, há um local onde a realidade é outra. Uma das bases de trabalho da organização missionária Jocum(Jovens Com Uma Missão) tem atraído jovens dos mais variados estados brasileiros para participarem de treinamentos de até seis meses em regime de internato, dispostos a enfrentar diferenças climáticas e culturais.


  O carioca Yohan conta que viveu um choque cultural porque no Rio de Janeiro as pessoas são mais abertas. “No Rio dá para chegar em qualquer pessoa zoando. Aqui o pessoal é educado, mas é fechado”, observa. Ele também fala que só nos últimos dois dias foi possível usar seu par de chinelos. Segundo ele, a diferença de temperatura do Rio de Janeiro para o Paraná é grande. Já Moisés, de Fortaleza (CE) conta que para conviver com pessoas tão diferentes é preciso renunciar muitas coisas. “Vivência em comunidade é um bagulho sério, mano”, brinca sobre a intimidade. Para o Bahiano Raniel, o mais brincalhão dos três, uma das dificuldades é a saudade de casa. “A convivência as vezes dói”, revela e afirma que isso está moldando o caráter dele.

 Algo que não falta quando pessoas estão reunidas é comida. Para isso a Jocum Almirante Tamandaré terceiriza o serviço de cozinha e com isso, ao trabalhar nesse setor, pessoas de fora, acostumadas com suas rotinas comuns em suas casas com suas famílias também estão mudando suas opiniões sobre viver de forma comunitária. É o caso de Lucas, o único homem da cozinha e afirma que já enfrentou preconceito por isso. Apesar de ser cozinheiro gastronômico, depois de enfrentar uma situação difícil aceitou a vaga de auxiliar e demonstra estar muito satisfeito com o trabalho. “Depois que eu entendi o tipo de vida deles e passei a ter também um vínculo com Deus como eles, minha vida mudou profissionalmente e na família”, afirma.  Darci, que veio do Pará e já viveu a experiência de uma escola de treinamento da Jocum diz que da cozinha consegue aconselhar os mais jovens por causa da experiência que ela teve em comunidade. Teresa é auxiliar eventual nos finais de semana. Mesmo com menos contato ela garante que a vida dela é outra, que ela tem aprendido muito. A equipe da cozinha destaca que a vida espiritual deu um salto quando se depararam dentro de um estilo tão diferente de vida.

Pessoas de diferentes locais
do Brasil vivem
como família
(Foto:Reprodução Facebook)
 Voluntários, homens e mulheres de várias idades que já passaram por escolas e hoje trabalham integralmente na organização, inclusive morando na base missionária chegam a dividir moradia com até outras oito pessoas. É o caso de Camila, que veio da Bahia. Quando conversamos com ela, estava desenformando um bolo recém-saído do forno, e contou que com tantas mulheres há uma disputa de espelho e banheiro, mas que é divertido estar junto. Ana Paula, do Amazonas e Larissa, de São Paulo moram com mais uma colega e relatam que as situações do dia a dia desafiam o comodismo, e até mesmo a culinária de cada uma, mas segundo elas, isso vale a pena. “Aprendemos uma com a outra”, afirma Larissa. Elas não escondem a amizade e o clima de bom humor entre elas na casa. “No começo era esquisito, tivemos que adaptar, principalmente na cozinha”, diz Ana Paula.

 Até mesmo quem não está acostumado a uma convivência tão intensa, ao experimentar isso por alguns dias chega até a pensar em viver dessa maneira. É isso que está acontecendo com Viviane, que veio da Bahia para um final de semana na Jocum. Ao participar do workshop GNI e Jornalismo, ela diz que apesar de conviver com pessoas, o fato de uma reunião tão grande de jovens é o diferencial. “Toparia viver uma vida assim. Acho muito interessante, apesar de saber que com marido e filhos seria uma mudança radical”, analisa Viviane.

 A Jocum está espalhada em mais de 180 países, cada base, apesar de manter o DNA da organização pode ser encontrada com diferentes características de acordo com a cultura local ou que predomina lá. Mas algo que não muda é esse convite a uma vida comunitária que pode gerar muita reflexão antropológica, afinal, como costuma refletir uma das líderes pioneiras de Jocum, Maria Helena: “o ser humano é sem fim e sem explicação”.